sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Bem de família Legal x Voluntário


Existem duas "espécies", ou "modalidades", de "bem de família":


1.    bem de família legal, previsto na Lei Federal 8.009, de 1990: trata-se de medida de natureza processual, que exclui o imóvel em que a família reside de constrições judiciais por dívida, salvo exceções de dívida tributária ou condominial oriunda do próprio bem;

- O bem de família legal, previsto na Lei 8.009, de 1990, não tem qualquer repercussão no Registro de Imóveis. Sua constituição independe do registro, operando-se ex vi legis, ou seja, à vista da lei. Por essa exata razão, constituindo o bem de família legal uma garantia inerente à moradia, podemos afirmar que ele se presta melhor a corporificar os mencionados desideratos constitucionais. Sua natureza jurídica é de garantia, de preservação de um patrimônio mínimo, um imóvel no qual possa residir a família. Vejamos o que diz a Lei 8.009/90:

"Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.
Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados".

Ou seja, recaindo a constrição sobre o único imóvel residencial do devedor, ele pode arguir que é o seu imóvel residencial e afastar a constrição. Tanto que a Lei 8009/90 reproduziu e estabeleceu que o único imóvel residencial do devedor é impenhorável, com exceções a essa impenhorabilidade, portanto, era uma relativa impenhorabilidade.

Quais são as exceções?

O imóvel residencial pode ser penhorado para garantir os créditos trabalhistas dos empregados que ali exercem as suas funções; pode ser penhorado pelo credor de financiamento concedido exatamente para a aquisição do imóvel; pode ser penhorado pelo credor de pensão alimentícia. Pode ser, ainda, penhorado para cobrança de impostos incidentes sobre o imóvel, como o Imposto

Predial e o Imposto Territorial, taxas e contribuições; pode ser penhorado pelo credor hipotecário para executar, exatamente, a hipoteca que recai sobre o imóvel residencial. E pode ser, também, penhorado para ser alienado se ficar provado que foi adquirido com produto do crime.

E acresceu-se uma última exceção, muito polêmica, que é a possibilidade de penhorar o imóvel residencial do fiador de contrato de locação. Essa exceção foi acrescida pela Lei do Inquilinato, em 1991.

Por fim, há uma recente decisão já estendendo essa impenhorabilidade ao único imóvel do devedor solteiro. É uma recentíssima decisão que não tem nem um mês.

Portanto, há uma tendência de alargar o âmbito de aplicação da Lei 8009/90.

2.     bem de família voluntário, previsto nos artigos 1.711 a 1.722, do Código Civil: trata-se de uma afetação feita pelo particular, destinando um imóvel em específico (eventualmente acompanhado de valores mobiliários) à residência da família.

- a instituição do bem voluntário só terá relevância no caso de a entidade familiar ser proprietária de mais de um imóvel para sua residência, e desejar tornar impenhorável aquele que de maior valor. Dessa forma, a eleição voluntária do bem de família mais valioso irá afastar a regra geral da incidência da impenhorabilidade sobre o imóvel de menor valor.

Em ambos os casos, impede-se alienação judicial do imóvel para a satisfação de dívida, o que veda, por exemplo, a instituição de hipoteca sobre imóvel já registrado como bem de família voluntário. No bem legal não se exige que a família seja proprietária exclusiva do imóvel, podendo ser, inclusive, mera possuidora. Já no bem voluntário, a propriedade deve ser plena e, pois, exclusiva para que seja possível a sua instituição.

Quanto às Condições de constituição do bem de família voluntário, parecem ser fundamentalmente três:

I- É preciso que, quando da instituição, não haja dívidas, por parte do(s) instituidor(es), cujo pagamento possa ser prejudicado, conforme já dizia o artigo 71 do CC de 1916;
II- O imóvel tanto pode ser urbano como rural, contanto que, naturalmente, se preste à sua destinação específica. A instituição pode abranger utensílios domésticos, gado e instrumentos de trabalho;
III- O imóvel deve vir sendo "a residência dos interessados por mais de dois anos" (v. Lei nº 6.742, de 05 de dezembro de 1979).

A forma de Instituição é a escritura pública (artigo 1.711 do CC); CPC de 1939 (artigo 647) e de 1973 (artigo 1.218, VI); Lei dos Registros Públicos (artigo 260).

Os cônjuges que pretendam destinar parte de seu patrimônio para instituir "Bem de Família", deverão observar o texto do Código Civil vigente, promulgado em 10/01/2002 (Lei Federal nº 10.406), aprovado com alteração do projeto original.

Pelo Código Civil de 1916, conforme Artigos 70 a 73, não havia limite de valor para tal instituição, e os cônjuges podiam, livremente, eleger o imóvel de maior valor para que o mesmo ficasse isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição.

Atualmente, com a entrada em vigor do novo Código, duas novidades significativas deverão ser observadas quando da instituição:

"Art. 1.711. Podem os cônjuges, ou a entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento, destinar parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial."
"Art. 1.712. O bem de família consistirá em prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios, destinando-se em ambos os casos a domicílio familiar, e poderá abranger valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família."

Portanto, há um limite para a instituição, ou seja, o teto será de UM TERÇO do patrimônio líquido do instituidor, existente ao tempo da instituição, e - inovando, a instituição poderá abranger valores mobiliários, compreendidos (Artigo 83 do CC): as energias que tenham valor econômico, os direitos reais sobre objetos móveis, os direitos pessoais de caráter patrimonial etc.

Outra observação: alguns operadores do Direito entendem que o imóvel deverá pertencer ao acervo do instituidor há pelo menos dois anos, face a preceito da antiga Lei Federal nº 6.742/1979, que modificou o Artigo 19 do Decreto-lei nº 3.200/1941, a saber:
“Art 1º - O art. 19 do Decreto-lei nº 3.200, de 19 de abril de 1941, que dispõe sobre o valor do bem de família, com a redação que lhe deu a Lei nº 2.514, de 27 de junho de 1955, passa a vigorar com a seguinte redação:
Art.19. - Não há limite de valor para o bem de família desde que o imóvel seja residência dos interessados por mais de dois anos."

Recomenda-se que os interessados consultem previamente o seu Tabelião de Notas e/ou seu Advogado para análise de cada situação, em particular, bem como o Oficial Registrador da localidade.

Portanto, temos duas espécies de bem de família: o voluntário, regido até hoje pelo artigo 70 a 73 do Código Civil, e o legal, resultante da Lei 8009/90.

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